Numa captura de imagens de um filme em stop-motion muitas
vezes você passa o dia inteiro no set e, ao término do trabalho, se você
conseguiu vinte segundos de filme de qualidade é o caso de abrir uma garrafa de
bebida e comemorar. Não se assuste com a aparente baixa produtividade. Stop
motion é um trabalho meticuloso que exige muita paciência e, talvez por causa
disso, resulta num enorme prazer: prazer de imaginar, transformar em cena o que
se imaginou, muitas vezes com resultados além dos imaginados. Independente se o
filme resultante é bom ou não, o processo do stop motion é sempre muito bom. O
set de um estúdio é cansativo, desafiador por vezes, desesperador em não poucos
momentos. Talvez isso aconteça por causa das características da técnica. Tudo
no set é manipulável: luz, cor, movimento, forma e composição e talvez mais
importante: o tempo é manipulável. Tanto o tempo em termos do ritmo, da
fluência de uma ação ou cena, até o tempo dramático de um personagem. Ou seja,
é uma carga de elementos criativos que é preciso conciliar que, às vezes, é
enlouquecedor e excitante! Felizmente, cinema é arte coletiva e o diálogo entre
os artistas no set é constante e necessário. Na composição de todos esses
elementos que o set impõe, os acidentes e os esquecimentos são impossíveis de
evitar. Tropeços na base do tripé da câmera alterando o quadro foram comuns em
nossa experiência. É muito difícil retornar o tripé ao exato lugar original e o
custo disso é pago na edição quando, numa tela maior, fica claramente nítido o
“pulo” da imagem. Resultado: corta-se três a quatro segundos “suados” de cena.
Outra coisa que
logo aprendemos é que todo elemento de cena deve ser firmemente fixado e
estabilizado. O resultado da não observância dessa saudável prática era
verificado na edição quando maciças montanhas se mexiam como por efeito de
terremotos, arbustos ganhavam vida desnecessária, pedras saltavam de um lugar
para outro de forma inesperada e inusitada. O resultado era o de sempre: cortes
de cena quando o Alex, o editor, não conseguia limpar digitalmente o “objeto
animado” que deveria ter ficado em seu lugar.
O alicate maldito à direita do quadro.
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Mas o objeto animado que mais deu trabalho no processo de edição de “3
Amigos” foi um pequeno alicate vermelho que Primo Gerbelli, o animador,
utilizada para movimentos pequenos, como os dedos das mãos dos bonecos. Algumas
vezes, o Primo teve de trabalhar sozinho no set: montar luz, movimentar
personagens, capturar imagem. Evidente que era impossível controlar tudo
durante um dia inteiro. Disso se aproveitou o alicate vermelho que passou a
aparecer insistentemente no quadro. Parecia que ele queria tanto estar na
animação que pensamos até em criar um personagem para ele. Sua intromissão na
edição filme foi à princípio exasperadora, irritante depois e, por fim,
provocava risos: seu desejo de estar em cena tornava impossível contê-lo nos
limites dos bastidores. O Alex precisou de horas de trabalho para apagá-lo
digitalmente dos frames e fazê-lo voltar ao anonimato, de onde o retiramos
agora.
O alicate maldito já buscou o centro da cena.
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